A SECULARIZAÇÃO E AS
TRÊS DIMENSÕES RELIGIOSAS
Dom Paulo Sergio Machado
(Bispo da Diocese de São Carlos)
(Bispo da Diocese de São Carlos)
A secularização como processo e o secularismo como
fruto marcam a atual posição do homem diante de Deus e, por conseqüência,
diante da religião. Vivemos um processo de secularização que já iniciou há
algum tempo, mais rápido para uns, mais lento para outros, mas que vai fincando
raízes aqui e ali.
Demora mais a chegar à sociedade rural do que à
urbana. Encontra mais resistência naquela do que nesta. Mas, convenhamos, os
ventos da modernidade carregam o vírus do secularismo pluralista, bem como à
luz dos prognósticos e profecias de uma crise global da religiosidade, a assim
chamada onda de secularização atinge as três dimensões da religião, definidas,
em inglês com os três “bês”: believing (crer); Belonging (pertencer) e Behaving
(comportar-se).
Quanto aos “believing”, constata-se que não há uma
significativa secularização. A maior parte da população se declara “crente”
(não na acepção de protestante, mas no sentido daquele que crê). Mesmo que esse
“crer” seja diluído numa mistura de crenças que vão da fé em um Deus que se
revela à crença num ser superior, vago e indefinido. Não obstante uma ativa
propaganda, alimentada, sobretudo pela mídia, o número de ateus ou agnósticos
não aumenta. Dos estudos sociológicos, concluí-se, pelo contrário, que a grande
maioria da sociedade brasileira identifica-se (ao menos formalmente) com a
Igreja Católica (72%).
Quanto ao “belonging”, nota-se que o debate
permanece vivo sobre a secularização da pertença e sobre a diminuição da
prática religiosa. Há uma multiplicidade de “igrejas” e “religiões”, o que
complica não somente o quadro, mas acaba confundindo a cabeça do crente. É
bastante difundida a idéia de que “todas as religiões são boas”, numa flagrante
compactuação com a ilogicidade da afirmação. O critério de “bondade” está
intimamente ligado ao critério de “verdade”. Duas coisas não podem ser “boas”,
ao mesmo tempo, se defendem princípios contraditórios.
Quanto ao “behaving”, observa-se que há uma ampla
secularização dos comportamentos. Do divórcio ao aborto e à homossexualidade, a
sociedade e as leis têm sempre menos em conta os preceitos da Igreja e/ou
Religião. Nas três dimensões, a análise e as observações partem de uma
perspectiva católica. Não podemos entende-las, sob grave risco de falsear a
realidade, às outras religiões, sejam cristãs ou não cristãs. O que, realmente,
observamos é que o católico freqüenta a Igreja, vai à missa, mas nem sempre
segue aquilo que a Igreja prega ou que o Papa ensina. É possível encontrar
católicos – e não são poucos – que sabem que o aborto é pecado grave e, mesmo
assim, o justificam e até mesmo o praticam. O mesmo se pode dizer com
referência ao divórcio, ao homossexualismo, ao uso de contraceptivos... É uma
religiosidade que possui, também no terreno moral, tendências fortemente individualistas
e que acaba coexistindo com a permissividade moral.
Estas observações são importantes não só para os
“doutores” como também – e principalmente – para os pastores. Há ovelhas e
ovelhas. Para muitos, a doutrina é uma, mas a prática é outra. Volta – sempre –
o discurso da separação entre fé e vida ou, em alguns casos – do distanciamento
entre fé e vida. Aproxima-las é um desafio e, ao mesmo tempo, uma missão. E
esta nos parece ser a urgente tarefa da Igreja Católica: trazer de volta as
ovelhas distantes e aproxima-las do pastor.
De acordo com os sociólogos da religião e com os
teólogos pastorais, a Igreja do Brasil renovar-se-á, sobretudo através das
pequenas comunidades e grupos religiosos. Infelizmente as comunidades eclesiais
de base foram esvaziadas por causa de ideologias e, instrumentalizadas,
acabaram perdendo o “E” de sua identidade, isto é, deixaram de ser eclesiais
para serem políticas.
No quadro geral da evangelização, a paróquia deverá
se transformar em “comunidade de comunidades”, constituindo, assim, uma “rede
de comunidades”. (cf. SD, 58; DA. 309)
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